CARNAVAL DO RIO: Estética realista, críticas ácidas, sambas de arrancarem lágrimas dos olhos. O título é de Nilópolis. Paraíso do Tuiuti surpreende.
Beija-flor campeã, Tuiuti vice
“O quilombo da favela é sentinela da Libertação!”
Texto e fotos de Valéria del Cueto
Dessa vez minha bola de cristal não vai errar. Informa que a TV Brasil atingirá, na noite desse sábado, a partir das 21:15h, sua maior audiência do ano, quiçá da década! Sintonize a emissora estatal para assistir ao espetacular Desfile das Campeãs do Grupo Especial do Carnaval do Rio de Janeiro de 2018.
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Na Sapucaí, começará o ano eleitoral. Ao vivo e a cores para quem quiser acompanhar. Vem por aí tiro, porrada e bomba pelos os usurpados, ou ainda não, “direitos constituídos”. Depois de apanhar durante todo o ano de 2017 o povo do carnaval dá o recado em seu campo de jogo. No templo do carnaval, a Passarela do Samba, da síntese dos anseios populares, vem a catarse.
A primeira escola a desfilar será a Mocidade Independente de Padre Miguel. Ela veio ali, na ponta da apuração, até que as notas de fantasias deram a rasteira que a levou à sexta posição. Sua passagem, com seu samba num andamento um pouco lento para os especialistas, embalou a passagem da Santíssima Trindade, Nehru, Dom Hélder, Chico Xavier pelo Sambódromo e gerou belas imagens sob um dramático amanhecer carioca.
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Com a verde e rosa aconteceu o contrário. Fotografando a bateria testemunhei os esforços dos meninos da Mangueira para darem conta do recado. Fantasias de bate-bola incluem máscaras tradicionais. Elas dificultavam a comunicação visual entre ritmistas, diretores e os Mestres Rodrigo Explosão e Vitor Art. E aí, foi superação. Do calor da indumentária à falta de elementos essenciais para a direção musical: o olhar e expressão para incentivar os componentes. O carnavalesco Leandro Vieira ao interpretar a personagem não considerou a “persona” do ritmista. Gabaritou em fantasia, mas em bateria e comissão de frente perdeu.
Teremos, certamente, uma ótima apresentação! A crítica carnavalizada e irreverente ao prefeito Crivella acertou em cheio. Se torna mais relevante no desfile de hoje depois dos temporais e outros problemas que colapsaram o Rio nos últimos dias. Ser o Judas do desfile é pouco, de acordo com os cariocas, diante da atuação do alcaide que está em viagem ao exterior.
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A quarta colocada foi a Portela. A saga dos judeus que vieram para Pernambuco e, expulsos, fundaram New York, remete à crise dos refugiados pelo mundo e conta histórias de superação e pirataria. A carnavalesca Rosa Magalhães perdeu pontos em alegoria e fantasia. A comissão de frente e o samba também…
O Salgueiro bateu na trave com as “Senhoras do Ventre do Mundo”. É aqui que Mato Grosso entra no carnaval 2018. O quilombo do Quariterê é citado no enredo e no samba. É um dos lugares onde ecoam saberes representados por Teresa de Benguela, uma das heroínas quilombolas. Foi justo nesse último quesito que perdeu um décimo e botou o campeonato nas mãos da Beija-flor. A belíssima alegoria da Pietá Negra marcou o desfile.
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A surpresa do ano foi, sem dúvida, a volta por cima do Paraíso do Tuiuti. De vilã do ano passado, graças a um dos acidentes que marcaram o carnaval de 2017, à unanimidade foi um longo caminho. Que passou pelo samba encomendado ao compositor Moacyr Luz e parceiros. Ele garantiu, no desempate, o inesperado vice-campeonato. A crítica contundente, a abertura impactante de sua comissão de frente e a – cereja do bolo – o vampiro Temer tirando os direitos dos trabalhadores, atingiram em cheio o imaginário popular, sintetizando a insatisfação coletiva.
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Embalada por um belo samba, o mais acessado nas mídias sociais, a Beija-flor, mais uma vez, arriscou uma mudança estética. Teatralizou, de forma realista e explícita as mazelas brasileiras. Descarnavalizou sua leitura. Não eram foliões, ou componentes de escola desfilando. Era eu, ou qualquer outra pessoa, ali. Vivendo a realidade. Nua e crua. Poderia ser você em qualquer das situações retratadas. Assim mesmo, sem fantasia…
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Para encerrar, um registro do passado dançou na bola de cristal de madame Valéria. Imaginem se Luciano Hulk tivesse virado enredo como chegou a ser cogitado lá pelo meio do ano? Ui…
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “É carnaval”, do SEM FIM… delcueto.wordpress.com
Transmissão: TV Brasil, 21:15h
Ordem dos desfiles:
Mocidade Independente
Mangueira
Portela
Salgueiro
Paraíso do Tuiuti
Beija-flor.
Edição Enock Cavalcanti
Diagramação Luiz Márcio – Gênio